FRAUDE
DO DEVEDOR (ALIENAÇÃO FRAUDULENTA)
fonte:
www.dizerodireito.com.br
a)
Fraude contra credores;
b)
Fraude à execução;
c)
Atos de disposição de bem já penhorado.
1.
FRAUDE CONTRA CREDORES (ou FRAUDE PAULIANA)
1.1
Conceito e caracterização
Vício
social (arts. 158 a 165 do
CC) que ocorre quando
o devedor insolvente ou próximo da insolvência aliena (gratuita ou
onerosamente) seus bens, com o objetivo de impedir que seu
patrimônio seja utilizado pelos credores para saldar as dívidas.
Ex:
Honofre contraiu um empréstimo
e não mais conseguiu pagar as parcelas. Antes que o mutuante
buscasse judicialmente o cumprimento da obrigação, ele transferiu
o seu carro (único bem que possuía em seu nome) ao irmão, que
sabia de toda a situação.
2.
Natureza da alienação fraudulenta:
Se
for reconhecida a ocorrência de fraude contra credores, a alienação
realizada será considerada válida, anulável ou nula?
1ª
corrente:
ANULÁVEL
|
2ª
corrente:
VÁLIDA,
mas INEFICAZ perante o credor
|
Adotada
pelo CC-2002 se considerarmos a sua redação literal:
Art.
159. Serão igualmente anuláveis os
contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência
for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro
contratante.
Nesse
sentido: Nelson Nery, Sílvio Rodrigues, Luiz Guilherme Marinoni.
|
Para
esta outra corrente, a alienação é válida, mas ineficaz
perante o credor.
Na
doutrina, é defendida por Yussef Cahali, Dinamarco, Teori
Zawascki.
|
Quais
são os pressupostos que devem ser provados pelo credor:
a) Eventus
damni (dano): é o prejuízo provocado ao
credor. Deverá ser demonstrado que a alienação acarretou prejuízo
ao credor porque esta disposição dos bens levou o devedor à
insolvência ou agravou ainda mais esse estado (pressuposto
objetivo).
b) Consilium
fraudis: é o conluio fraudulento entre o alienante e
o adquirente. Para que haja a anulação, o adquirente precisa estar
de má-fé (pressuposto subjetivo).
Quando
a insolvência do devedor/alienante for notória. Ex:
Varig.
Quando
houver motivo para que a insolvência do devedor/alienante seja
conhecida do outro contratante. Ex:
se o negócio jurídico for celebrado entre dois irmãos ou entre
sogro e genro.
Pressupostos
da fraude contra credores
|
No
caso de alienação onerosa:
Eventus
damni + consilium fraudis + anterioridade do crédito
|
Na
alienação gratuita ou remissão de dívida:
Eventus
damni + anterioridade do crédito
|
c) Anterioridade
do crédito:
Assim,
em regra, somente quem já era credor no momento da alienação
fraudulenta é que poderá pedir a anulação do negócio jurídico.
Dispensa
excepcional da anterioridade do crédito: quando for verificado que
houve uma fraude predeterminada em detrimento de credores futuros
(REsp 1092134/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/08/2010).
Reconhecimento
da fraude contra credores
Legitimidade
para a ação:
Polo
ativo:
Em
regra, a ação deverá ser proposta pelo credor quirografário.
Credor
que possua uma garantia contra o devedor/alienante, caso demonstre
que a sua garantia se tornou insuficiente em razão da alienação
promovida pelo devedor.
Polo
passivo:
Em
regra, a ação é proposta contra o devedor insolvente e contra a
pessoa que com ele celebrou o negócio fraudulento (litisconsórcio
passivo necessário).
Se
a pessoa que celebrou o negócio fraudulento já repassou o bem para
uma terceira pessoa, a ação será intentada contra o devedor
insolvente, contra a pessoa que celebrou o negócio com o devedor e
contra o terceiro adquirente (deverá ser provado que o terceiro agiu
de má-fé), cfe. arts. 161, CC.
Prazo
(art. 178, CC):
A
ação pauliana possui prazo decadencial de 4 anos, contados
da data em que foi realizada a alienação.
Impossibilidade
do reconhecimento da fraude contra credores, de forma incidental, em
um outro processo que não seja originado por conta de uma ação
pauliana:
Súmula
195-STJ: Em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por
fraude contra credores.
Outros
dispositivos legais sobre a fraude contra credores: arts.
160 a 165, CC.
2.
FRAUDE À EXECUÇÃO
2.1
Conceito
consiste
no ato do devedor de alienar ou gravar com ônus real (ex: dar em
hipoteca) um bem que lhe pertence, em uma das situações previstas
nos incisos do art. 792 do NCPC (art. 593, CPC73).
A
fraude contra a execução, além de causar prejuízo ao credor,
configura ato atentatório à dignidade da Justiça (NCPC, art.
774, I; art. 600, I, do CPC).
2.
Hipóteses em que há fraude à execução segundo o CPC
Se
o devedor alienou ou gravou com ônus real determinado bem
praticando fraude à execução, esse bem continua respondendo pela
dívida e poderá ser executado (poderá ser expropriado pelo
credor) (NCPC,
art. 790, V;
art. 592, V, do CPC).
É
possível que ocorra fraude à execução se a alienação ou
oneração ocorreu antes que a execução tenha sido proposta?
NÃO.
Para que ocorra a fraude à execução é necessário que a execução
tenha sido ao menos ajuizada.
É
possível que ocorra fraude à execução se a alienação ou
oneração ocorreu antes que o executado tenha sido citado?
Em
regra, NÃO. Em regra, para que haja fraude à execução é
indispensável que a alienação ou oneração tenham acontecido
após o devedor ter sido citado. Isso porque para que haja fraude
é necessário que o devedor soubesse que estava sendo executado
quando alienou ou onerou o bem. Quando o devedor é citado
existe a certeza de que a partir daquele momento ele tem consciência
da existência do processo.
Logo,
se o devedor vender ou onerar o bem depois de a execução ter sido
ajuizada, mas antes de ele ser citado, em regra, não haverá fraude
à execução.
Por
que se falou “em regra”? É possível que se reconheça a fraude
à execução se o devedor vendeu ou onerou o bem mesmo antes de ser
citado?
SIM.
Existe uma situação em que será possível reconhecer a fraude à
execução quando o devedor alienou ou onerou o bem após o
ajuizamento, mas antes de ser citado. Isso ocorre quando o exequente
fez a averbação da execução nos registros públicos (NCPC,
art. 828; art. 615-A do CPC). Esse artigo permitiu que o
exequente faça a averbação do ajuizamento da execução em
registro público de bens sujeitos à penhora ou arresto.
Explicando
em simples palavras:
• Logo
após dar entrada na execução, o credor pode obter uma certidão no
fórum declarando que ele ajuizou uma execução contra Fulano
(devedor) cobrando determinada quantia.
• Em
seguida, o exequente vai até os registros públicos onde possa haver
bens do devedor lá registrados (exs: registro de imóveis, DETRAN,
registro de embarcações na capitania dos portos) e pede para que
seja feita a averbação (uma espécie de anotação/observação
feita no registro) da existência dessa execução contra o
proprietário daquele bem.
• Assim,
se alguém for consultar a situação daquele bem, haverá uma
averbação (anotação) de que existe uma execução contra o
proprietário.
• Essa
providência serve como um aviso ao devedor e um alerta para a pessoa
que eventualmente quiser adquirir a coisa já que eles, ao
consultarem a situação do bem, saberão que existe uma execução
contra o alienante e que aquele não pode ser vendido, sob pena de
haver fraude à execução.
• Se
o devedor alienar ou onerar o bem após o credor ter feito a
averbação, essa alienação ou oneração é ineficaz (não produz
efeitos) porque haverá uma presunção
absoluta
de que ocorreu fraude à execução.
→ Regra
geral: para que haja fraude à execução é indispensável que
tenha havido a citação válida do devedor.
→
Exceção:
mesmo sem citação válida, haverá fraude à execução se, quando
o devedor alienou ou onerou o bem, o credor já havia realizado a
averbação da execução nos registros públicos (art. 615-A do
CPC). Presume-se em fraude de execução a alienação ou oneração
de bens realizada após essa averbação (§ 3º do art. 615-A).
Se
o credor perceber que o devedor, mesmo após ter sido proposta a
execução, fez alienação ou oneração de bens ele precisará
ajuizar uma ação para provar que houve a fraude à execução?
NÃO.
Basta que o credor lesado apresente uma petição ao juízo onde
tramita a execução pedindo que seja reconhecida a fraude à
execução e declarada a ineficácia
do ato de disposição (alienação ou oneração).
Atenção:
o ato praticado em fraude à execução é um ato válido, mas
ineficaz perante o credor (reconhecida a fraude à execução, o
juiz decretará a ineficácia da alienação).
Como
fica a situação da pessoa que adquiriu o bem alienado (chamado de
“terceiro”)? Esse terceiro perderá o bem? Como protegê-lo?
Ao
mesmo tempo que se deve evitar a fraude à execução, é também
necessário que se proteja o terceiro de boa-fé. Assim, somente será
possível reconhecer a fraude à execução se:
• ficar
provado a má-fé do terceiro adquirente; ou
• se
no momento da alienação, o bem vendido já estava penhorado na
execução e essa penhora estava registrada no cartório de imóveis
(NCPC, art. 836;
§ 4º do art. 659, CPC73).
Súmula
375-STJ: O reconhecimento da fraude à execução depende do
registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do
terceiro adquirente.
De
quem é o ônus de provar que o terceiro adquirente estava de má-fé?
Do
credor (exequente). Em regra, a boa-fé se presume, a má-fé se
prova.
O
que é o registro da penhora? É o mesmo que a averbação do art.
798 que vimos acima?
NÃO.
O registro da penhora é uma coisa e a averbação do art. 798 do
NCPC é outra completamente diversa.
Penhorar
significa apreender judicialmente os bens do devedor para
utilizá-los, direta ou indiretamente, na satisfação do crédito
executado.
A
penhora ocorra depois que já existe execução em curso e o
executado já foi citado e não pagou.
Após
ser realizada a penhora, o exequente, para se resguardar ainda mais,
pode pegar, na Secretaria da Vara onde tramita a execução, uma
certidão de inteiro teor narrando que foi realizada a penhora sobre
determinado bem. Após, de posse dessa certidão, ele poderá ir até
o cartório de registro de imóveis e pedir que seja feita
a averbação da penhora
(NCPC, art. 836;
art. 659, §4°).
Caso
faça a averbação isso irá gerar uma presunção absoluta de que
todas as pessoas sabem que esse bem está penhorado. Logo, se alguém
adquirir o bem, tal pessoa será considerada terceiro de má-fé e
essa venda não será eficaz: o terceiro, mesmo tendo pago o preço,
perderá a coisa porque adquiriu bem cuja penhora estava registrada.
Crítica
à Súmula 375-STJ
De
forma muito rápida para não complicar ainda mais esse tema que é
difícil, deve-se alertar para o fato de que alguns doutrinadores
criticam esse enunciado porque ele confunde o instituto da “fraude
à execução” com a “alienação de bem penhorado”.
Para
a doutrina, quando o executado vende um bem seu que está penhorado,
ele não comete “fraude à execução”, mas sim um ato
fraudulento ainda mais grave e atentatório à jurisdição chamado
de “alienação de bem penhorado”.
Cuidado:
na grande maioria das provas, fique com o entendimento exposto na
súmula. Somente fale sobre essa crítica da doutrina se você for
expressamente perguntado sobre isso. Caso contrário, não é
necessário entrar nessa celeuma.
Teses
definidas pelo STJ
O
STJ apreciando o tema sob o regime do recurso repetitivo, reafirmou
os entendimentos acima expostos e definiu as seguintes teses:
1)
Em regra, para que haja fraude à execução é indispensável que
tenha havido a citação válida do devedor;
2)
Mesmo sem citação válida, haverá fraude à execução se, quando
o devedor alienou ou onerou o bem, o credor já havia realizado a
averbação da execução nos registros públicos (NCPC, art. 828;
art. 615-A do CPC). Presume-se em fraude de execução a alienação
ou oneração de bens realizada após essa averbação (NCPC, art.
828, § 4º; § 3º do art. 615-A do CPC).
3)
Persiste válida a Súmula 375 do STJ segundo a qual o reconhecimento
da fraude de execução depende do registro da penhora do bem
alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente;
4)
A presunção de boa-fé é princípio geral de direito
universalmente aceito, devendo ser respeitado a parêmia (ditado)
milenar que diz o seguinte: “a boa-fé se presume, a má-fé se
prova”;
5)
Assim, não havendo registro da penhora na matrícula do imóvel, é
do credor o ônus de provar que o terceiro adquirente tinha
conhecimento de demanda capaz de levar o alienante à insolvência
(NCPC, art. 836; art. 659, § 4º, do CPC).
STJ.
Corte Especial. REsp 956.943-PR, Rel. originária Min. Nancy
Andrighi, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado
em 20/8/2014 (recurso repetitivo) (Info 552).